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O real está pior do que se imagina

Atualizado: 25 de out. de 2020

Felipe Lange


Que a nossa moeda é uma das piores do mundo, até a imprensa internacional já sabe. Tempos atrás, o Banco Central Americano até chegou a dar uma "alfinetada" sobre a política pombalística do banco central brasileiro. A nossa trajetória de desvalorização está sem data prevista para acabar e alguns resultados já podemos colher (como o explosivo índice de preços ao produtor, só não pior do que em 2003 e com o pavor do Lula recém-eleito), apesar de o IPCA ainda estar em valores baixos (graças ao choque de oferta e de demanda sofrido pelos lockdowns).


Com a explosão nas exportações de commodities (tendo a China como um dos principais consumidores), Bolsonaro teve até que zerar as tarifas de importação de soja e milho, para domar o desabastecimento interno causado pelo aumento de exportações e pela maior procura pelo dólar americano. Ele felizmente teve bom senso e não se aventurou em taxar as exportações, o que certamente seria um desastre.


A crise do coronavírus foi uma boa forma para o dólar se valorizar mundialmente com o pânico gerado nos investidores, entretanto, o Índice DXY vem caindo desde maio de 2020, agora chegando aos menores valores desde meados de 13 de maio de 2018.


Dito isso, neste curto artigo (inspirado neste), iremos comparar o desempenho do real em relação aos vizinhos e à algumas economias mundiais, desde o dia 01/01/2019 até os dias de hoje (mais exatamente no dia 18/10/2020). Preparem-se que agora veremos muitos gráficos. Escolhi essa data para começo de período pois ela marca o início do novo e atual governo.


Vamos começar pelas principais moedas do mundo. Primeiro pelo dólar americano e depois por aquelas que compõem o famoso Índice DXY.


Em relação ao dólar, um real comprava 0,25 dólar em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 0,17 dólar. Ou seja, em relação ao dólar, o real se desvalorizou em 33,24 %.


Taxa de câmbio BRL/USD



Em relação ao euro, um real comprava 0,22 euro em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 0,15 euro. Ou seja, em relação ao euro, o real se desvalorizou em 32,14 %.


Taxa de câmbio BRL/EUR



Em relação ao franco suíço, um real comprava 0,25 franco suíço em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 0,16 franco suíço. Ou seja, em relação ao franco suíço, o real se desvalorizou em 35,07 %.


Taxa de câmbio BRL/CHF



Em relação à coroa sueca, um real comprava 2,28 coroas suecas em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 1,58 coroa sueca. Ou seja, em relação à coroa sueca, o real se desvalorizou em 30,78 %.


Taxa de câmbio BRL/SEK



Em relação ao iene japonês, um real comprava 28,3 ienes japoneses em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 18,92 ienes japoneses. Ou seja, em relação ao iene japonês, o real se desvalorizou em 33,14 %.


Taxa de câmbio BRL/JPY



Em relação à libra esterlina, um real comprava 0,20 libra esterlina em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 0,13 libra esterlina. Ou seja, em relação à libra esterlina, o real se desvalorizou em 31,57%.


Taxa de câmbio BRL/GBP



Correção do dia 25/10/2020! Esqueci de colocar o dólar canadense, que está entre as moedas componentes do Índice DXY. Em relação ao dólar canadense, um real comprava 0,35 dólar canadense em 01/01/2019. No dia 19/10/2020, um real comprava 0,23 dólar canadense (não tem mais do dia 18/10, peço desculpas por isso). Ou seja, em relação ao dólar canadense, o real se desvalorizou em 34,28 %. Como o Trading View não tem a taxa inversa BRL/CAD, coloquei então a taxa em CAD/BRL. Para conseguir o resultado em BRL/CAD, basta dividir 1 pela taxa de câmbio do dia.


Taxa de câmbio CAD/BRL



Certo, com relação às principais moedas do mundo, é um grande desafio o real conseguir se valorizar e você pode até alegar de que fui exigente demais. Vamos ver então como a nossa moeda se destaca perante os vizinhos.



Real brasileiro contra os vizinhos


E com relação aos vizinhos da América do Sul, será que o real brasileiro se destacou?


Em relação ao peso uruguaio, um real comprava 8,40 pesos uruguaios em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 7,56 pesos uruguaios. Ou seja, em relação ao peso uruguaio, o real se desvalorizou em 10%. Como o Trading View não tem a taxa inversa BRL/UYU, coloquei então a taxa em UYU/BRL. Para conseguir o resultado em BRL/UYU, basta dividir 1 pela taxa de câmbio do dia. Assim, 1 dividido por 0,131 dá em aproximadamente 7,56, cotação do dia 18/10/2020.


Taxa de câmbio UYU/BRL



Em relação ao peso chileno, um real comprava 178,72 pesos chilenos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 140,33 pesos chilenos. Ou seja, em relação ao peso chileno, o real se desvalorizou em 21,48%.


Taxa de câmbio BRL/CLP



Em relação ao boliviano, um real comprava 1,78 boliviano em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 1,22 boliviano. Ou seja, em relação ao boliviano, o real se desvalorizou em 31,46%.


Taxa de câmbio BRL/BOB



Em relação ao peso colombiano, um real comprava 835,5 pesos colombianos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 679,3 pesos colombianos. Ou seja, em relação ao peso colombiano, o real se desvalorizou em 18,69%.


Taxa de câmbio BRL/COP



Em relação ao guarani paraguaio, um real comprava 1529,37 guaranis paraguaios em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 1247,57 guaranis paraguaios. Ou seja, em relação ao guarani paraguaio, o real se desvalorizou em 18,42 %. Como não encontrei dados no Trading View, obtive os dados pelo site XE, através de uma captura de tela.


Taxa de câmbio BRL/PYG



Em relação ao sol peruano, um real comprava 0,86 sol peruano em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 0,63 sol peruano. Ou seja, em relação ao sol peruano, o real se desvalorizou em 26,74 %. Como não encontrei dados no Trading View, obtive os dados pelo site XE, através também de uma captura de tela.


Taxa de câmbio BRL/PEN



Em relação ao dólar surinamense, um real comprava 1,92 dólar surinamense em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 2,51 dólares surinamenses. Ou seja, em relação ao dólar surinamense, o real se valorizou em 30,72 %. Como não encontrei dados no Trading View, obtive os dados pelo site XE, através de uma captura de tela. Detalhe importante é que lá a inflação voltou a incomodar às dezenas.


Taxa de câmbio BRL/SRD



Com a Argentina e a Venezuela o desafio será maior. Teremos de obter o câmbio paralelo, pois na Argentina o Macri reimporia o controle cambial em setembro daquele ano (uma reencarnação parcial do chamado cepo), no qual consiste em restringir a compra de dólares no câmbio oficial. Fernández piorou o problema, já que ele passou a aumentar as restrições e tributar a compra de dólares. O resultado é que o câmbio oficial, restringido, tornou-se fictício.


Em relação ao peso argentino, usando a cotação do câmbio paralelo, um real comprava 9,67 pesos argentinos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 31,56 pesos. Ou seja, em relação ao peso argentino, o real se valorizou em 226,37 %. Infelizmente não encontrei nenhum gráfico com a cotação do câmbio paralelo, então eu coloquei o gráfico do câmbio paralelo entre dólar americano e peso argentino. Para obter o valor em reais, basta dividir o câmbio paralelo pela taxa de câmbio entre dólar americano e real brasileiro (da mesma data da taxa de câmbio paralelo entre dólar americano e peso argentino).


Taxa de câmbio USD/ARS



Na Venezuela, o controle cambial é mais antigo, portanto existindo há alguns anos.


Em relação ao bolívar soberano, um real comprava 188,15 bolívares soberanos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 81.499,59 bolívares soberanos. Ou seja, em relação ao bolívar soberano, o real se valorizou em 43.216,28 %. Como não encontrei dados no Trading View, obtive os dados pelo site CUEX.


Taxa de câmbio BRL/VEF



Ou seja, no continente sul-americano, o real só ganha do bolívar soberano, do dólar surinamense e do peso argentino. E com relação ao México, país que recentemente elegeu o socialista Andrés Manuel Lopez Obrador?


Em relação ao peso mexicano, um real comprava 5,07 pesos mexicanos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 3,74 pesos mexicanos. Ou seja, em relação ao peso mexicano, o real se desvalorizou em 26,23 %.


Taxa de câmbio BRL/MXN



E quanto ao BRICS?


Vamos comparar agora com as chamadas economias do BRICS: Rússia, Índia, China e África do Sul.


Será que a Rússia, com seu histórico recente de calote, sanções e participação em guerras, perderá para o Brasil?


Em relação ao rublo russo, um real comprava 17,81 rublos russos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 13,77 rublos russos. Ou seja, em relação ao rublo russo, o real se desvalorizou em 22,68 %.


Taxa de câmbio BRL/RUB



Em relação à rúpia indiana, um real comprava 17,86 rúpias indianas em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 13,01 rúpias indianas. Ou seja, em relação à rúpia indiana, o real se desvalorizou em 27,15 %.


Taxa de câmbio BRL/INR



E com relação à África do Sul, cujo governo também é socialista? Ganhamos deles? Em relação ao rand sul-africano, um real comprava 3,79 rands sul-africanos em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 2,94 rands sul-africanos. Ou seja, em relação ao rand sul-africano, o real se desvalorizou em 22,42 %.


Taxa de câmbio BRL/ZAR



E com a China? Em relação ao renminbi, um real comprava 1,76 renminbi em 01/01/2019. No dia 18/10/2020, um real comprava 1,19 renminbi. Ou seja, em relação ao renminbi, o real se desvalorizou em 32,38 %.


Taxa de câmbio BRL/CNY



E em relação ao dólar, será que o real brasileiro sofreu menos do que as outras moedas? Vamos descobrir agora. Como infelizmente não consegui configurar o gráfico para até o dia 18 deste mês, então o dia último será o 20 e peço desculpas por essa imprecisão. Ainda pode haver algumas imprecisões a mais por causa do horário no qual a captura foi feita, entretanto mesmo descontando um dia, o fato contrastante continua o mesmo e a taxa de câmbio não mente. Por esse motivo, recolocarei o Brasil por último com o dia 20.

Primeiro, vamos comparar com as principais moedas do mundo, pegando o mesmo período aproximado (01/01/2019 até 20/10/2020). Assim temos:



Laranja: Franco suíço, valorizou-se em 9,18 % em relação ao dólar americano.

Azul: Euro, valorizou-se 4,26 % em relação ao dólar americano.

Roxo escuro: Iene japonês, valorizou-se 3,22 % em relação ao dólar americano.

Amarelo: Coroa sueca, valorizou-se 3,17 % em relação ao dólar americano.

Verde água: Libra esterlina, valorizou-se 2,74 % em relação ao dólar americano.


Taxa de câmbio (desempenho) perante o dólar americano das principais moedas do mundo



Coloquemos também o dólar canadense (referente à correção do dia 25/10/2020). A moeda se valorizou em aproximadamente 3,79 %.


Taxa de câmbio entre dólar canadense e dólar americano (CAD/USD)



Agora, vamos comparar aos vizinhos da América do Sul.


Azul: Peso uruguaio, desvalorização de 24,26 % em relação ao dólar americano.

Verde água: Boliviano, valorização de 0,36 % em relação ao dólar americano.

Roxo claro: Sol peruano, desvalorização de 6,23 % em relação ao dólar americano.

Laranja: Peso chileno, desvalorização de 11,76 % em relação ao dólar americano.

Amarelo: Peso colombiano, desvalorização de 15,18 % em relação ao dólar americano.

Roxo escuro: Guarani paraguaio, desvalorização de 15,85 % em relação ao dólar americano.


Taxa de câmbio (desempenho) dos vizinhos perante o dólar americano



O bolívar soberano não tem disponível no gráfico, mas já é sabido de que a sua desvalorização nesse período foi de 100 % (isso mesmo). No caso do peso argentino (cuja cotação paralela também não tem disponível no gráfico), a desvalorização foi de aproximadamente 77,9 % e, no dólar surinamense, algo como perto de 45,38 %.


Comparando agora ao México e ao BRICS:


Azul: Renminbi, valorização de 2,98 % em relação ao dólar americano.

Amarelo: Rúpia indiana, desvalorização de 5,58 % em relação ao dólar americano.

Laranja: Peso mexicano, desvalorização de 7,03 % em relação ao dólar americano.

Verde água: Rublo russo, desvalorização de 10,76 % em relação ao dólar americano.

Roxo escuro: Rand sul-africano, desvalorização de 12,45 % em relação ao dólar americano.


Taxa de câmbio (desempenho) perante o dólar americano de México e BRICS (ou melhor, "RICS")



E, por fim, o Brasil:




Fazendo um cálculo percentual com o valor aproximado da taxa de câmbio de 01/01/2019 e da taxa cambial de 20/10/2020, obtemos uma desvalorização de aproximadamente 31,03 %. Então, mesmo assim, perdemos para a maioria dos países ao redor do mundo. Só não ficamos piores do que países como Venezuela, Suriname e Argentina. Provavelmente há outros piores do que nós, mas se listados todos aqui, o artigo ficará demasiado longo.


Ou seja, não apenas o real se desvalorizou em relação às moedas mais sólidas e fortes do mundo, mas a nossa moeda está se desvalorizando até em relação aos vizinhos e aos países emergentes, alguns de economias mais próximas à nossa (e mais agrária), alguns deles até com mais instabilidade política do aqui, como a Rússia e de regimes ditatoriais como o da China.


Os lockdowns destruíram várias economias ao redor do mundo, mas o Brasil foi um dos poucos países onde os custos de produção explodiram, mesmo em meio à queda na demanda em vários setores, desemprego crescente e decréscimo na renda. Ao passo que aqui o índice de preços ao produtor subiu 26 % no mês de setembro, nos Estados Unidos esse índice subiu 0,4 %, na Colômbia houve queda de 1,3 %, no Uruguai a subida foi de 8,46 %, queda de 1,6 % no Equador, subida de 4,5 % no México e queda de 0,1 % em El Salvador. Isso mostra a intensidade que foi a desvalorização cambial no Brasil.


O que certamente será um desafio para os próximos anos: além de os lockdowns terem descapitalizado várias empresas, a desvalorização cambial foi outro fator para o fenômeno, já que os custos de produção tornaram-se absurdamente crescentes, ao mesmo tempo em que muitos negócios perderam demanda e muitos simplesmente fecharam em definitivo. Assim, a margem de lucro caiu, sobrando menos recursos para ampliar investimentos, contratar mão de obra e conceder aumentos salariais aos que ainda estão empregados.


Será que até 2022 pagaremos mais de R$ 6 por cada dólar americano? Só o tempo dirá.


Que o Bolsonaro fique atento à moeda. Karl Schiller tinha razão.



 

Foto de Carlinhos Rodrigues, da Agência RBS. Caso a imagem for de propriedade exclusiva, favor avisar e farei a remoção imediata da foto.


 

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