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O caso do Brasil contra o protecionismo

  • Foto do escritor: Felipe Lange
    Felipe Lange
  • há 14 horas
  • 5 min de leitura

O gargalo do Brasil para a excelência industrial.

Fabricio Antezana Duran e Gabriel Grilli


O Brasil, gigante sul-americano conhecido por sua rica cultura, vastos recursos naturais e ambições industriais precoces, orgulha-se há muito tempo de construir uma base industrial que abrange tudo, de sabonetes a aeronaves. Muitos atribuem esse crescimento a políticas protecionistas: altas tarifas sobre importações, isenções fiscais para produtores nacionais e generosos incentivos governamentais. Mas, por trás dessa narrativa, há uma história diferente: ineficiência, potencial perdido e fracassos dispendiosos. Em vez de acelerar a ascensão do Brasil, o protecionismo frequentemente o freou, criando uma indústria dependente de favores políticos em vez do desempenho do mercado.


A experiência brasileira de incentivar seu setor automotivo começou já em 1919, quando a Ford se tornou a primeira fabricante a montar veículos no país. A empresa americana foi atraída por um generoso pacote de isenções fiscais e proteções à importação, desfrutando de amplas isenções fiscais sobre bens de capital importados e tarifas mais altas sobre veículos concorrentes importados do exterior. Essas medidas foram estendidas a outras empresas, como GM e Romi. Mas, desde o início, esses incentivos distorceram o mercado, em vez de desenvolvê-lo.


O fracasso inicial mais infame? Fordlândia. Construída na década de 1920 como uma cidade industrial independente nas profundezas da Amazônia, destinava-se a suprir as necessidades de borracha da Ford. Mas entrou em colapso em duas décadas, devido a doenças tropicais, planejamento inadequado e arrogância cultural. A Ford perdeu o equivalente moderno a US$ 170 milhões apenas em bens de capital, enquanto as perdas totais, incluindo mão de obra, custos de capital e insumos inutilizáveis, permanecem incertas. O projeto não fracassou porque a ideia era falha, mas porque estava isolado da pressão competitiva e do feedback do mundo real.


Na década de 1950, o presidente Juscelino Kubitschek tornou a industrialização por meio do protecionismo a doutrina oficial do Brasil. Seu Plano de Metas proibiu veículos importados e exigiu que as fabricantes nacionalizassem a produção em troca de incentivos fiscais. Marcas como Volkswagen e GM se apressaram, não porque o Brasil fosse o melhor lugar para fabricar carros, mas porque era um dos poucos lugares onde tinham garantia de vendê-los. Entre 1956 e 1961, três decretos foram editados oferecendo incentivos fiscais e estratégicos especiais para empresas que se comprometessem com a produção nacional. Essa estratégia fazia parte de uma tendência regional mais ampla conhecida como Industrialização por Substituição de Importações (ISI), que visava reduzir a dependência de produtos estrangeiros por meio do desenvolvimento de indústrias nacionais sob altas tarifas. Embora tenha estimulado o rápido crescimento industrial no curto prazo, a ISI frequentemente levou a setores ineficientes e pouco competitivos, protegidos da concorrência global, sobrecarregando os consumidores com preços mais altos e menos opções.


Na década de 1970, o Brasil havia construído uma indústria automobilística em expansão que empregava centenas de milhares de pessoas. Mas havia um porém: sem concorrência estrangeira, havia poucos motivos para inovar ou cortar custos. Os consumidores brasileiros pagaram o preço, literalmente. Em 2025, o Toyota Corolla híbrido médio custava mais de US$ 13.000 a mais no Brasil do que no México, sendo 18 % menos econômico. Embora engenheiros brasileiros tenham desenvolvido motores flexíveis em combustível, o setor como um todo ficou para trás em qualidade e inovação.


Com o tempo, o modelo protecionista brasileiro tornou-se não apenas ineficiente, mas também insustentável. Os formuladores de políticas responderam dobrando a aposta. Programas como o Rota 2030 ofereciam incentivos fiscais para o cumprimento de metas vagas de produção ou cotas de conteúdo local. Essas políticas sustentaram o setor temporariamente, mas não o prepararam para uma competição real. Décadas de proteção não se transformaram em competitividade global. As fabricantes de carros brasileiras atendem bem o mercado interno, mas têm dificuldades para exportar. No pico de produção de 3,7 milhões de veículos por ano em 2013, o Brasil exportou apenas cerca de 15 % dessa produção — seus principais parceiros comerciais no setor automotivo foram Argentina, México, Colômbia, Uruguai e Chile.


A maioria das fábricas brasileiras não é competitiva em termos de custos o suficiente para enviar carros para a Europa ou Ásia em grandes quantidades. Eventualmente, quando a economia brasileira desacelerou na década de 2010 devido a uma combinação de queda nos preços das commodities, instabilidade política e gastos públicos insustentáveis, a produção despencou e gigantes globais como a Ford começaram a fechar fábricas e até mesmo a cessar completamente as operações.


Desde 2021, a utilização da capacidade na indústria automobilística brasileira tem ficado abaixo da eficiência ideal, sinalizando capacidade ociosa persistente, demanda fraca e desafios de competitividade nos mercados globais.



A saída da Ford em 2021 foi simbólica. Depois de mais de um século no Brasil, a empresa não tinha justificativa para permanecer, não sem novos subsídios. Naquela época, a Ford já havia sofrido uma década de grave subutilização e incapacidade de cobrir custos fixos sem subsídios de sua matriz americana. Em 2023, no entanto, a Ford sinalizou que poderia retornar ao Brasil, após o presidente Lula insinuar oferecer grandes vantagens estratégicas aos fabricantes de veículos elétricos que se instalassem no país. Mais uma vez, a indústria não se voltou para a inovação ou as exportações, mas para o resgate do governo.


O Brasil ainda exporta apenas uma fração de sua produção de veículos — principalmente para a vizinha Argentina, sob acordos comerciais administrados pelo Mercosul. Enquanto isso, o México optou por um caminho mais aberto. Após assinar o NAFTA em 1994, reduziu tarifas, acolheu investidores estrangeiros e se concentrou em se tornar uma plataforma de exportação. Hoje, as fábricas mexicanas produzem mais carros a custos mais baixos e com maior qualidade do que o Brasil, apesar da falta de uma grande marca nacional. A diferença? Concorrência. As fábricas mexicanas atendem aos mercados globais. Os brasileiros atendem a um mercado interno protegido, a um custo para os consumidores e a produtividade.


Talvez a lição mais preocupante da experiência brasileira seja como os incentivos, quando mal utilizados, podem consolidar disfunções. Subsídios estatais distorceram a logística: o Brasil construiu rodovias em vez de ferrovias, embora o transporte aquaviário fosse mais barato para muitas regiões. O auge da influência da indústria automobilística em Brasília coincidiu com a década mais transformadora do desenvolvimento de infraestrutura no Brasil e, previsivelmente, direcionou os investimentos para rodovias em detrimento de ferrovias, hidrovias e transporte aéreo. Essas escolhas deixaram uma marca duradoura: ainda hoje, cerca de 86 % dos bens de consumo e 74 % dos bens de capital no Brasil são transportados por caminhão, em comparação com apenas 5 % e 8 % por hidrovias, apesar dos 7.357 km de litoral e rios do Brasil cobrirem 12 % da superfície de água doce do mundo.


Mesmo agora, quando novas políticas como o Rota 2030 visam focar na inovação, os resultados têm sido modestos. Os carros podem ter melhor eficiência de combustível e recursos de segurança, mas o setor ainda está longe de se tornar competitivo globalmente.


A política industrial pode nutrir uma indústria incipiente, mas quando essa indústria se torna dependente de favores estatais, ela não amadurece. O setor automotivo brasileiro nasceu entre muros e prosperou com subsídios. Mas agora, com a liberalização no horizonte, pronta para eliminar gradualmente as tarifas automotivas nos próximos anos, o setor precisa se adaptar ou entrar em colapso. Como o Acordo Comercial Mercosul-UE, que estabeleceu um acordo entre o maior bloco comercial da América do Sul e a União Europeia, que visa eliminar tarifas e abrir mercados gradualmente ao longo dos próximos anos.


Fordlândia continua sendo uma cidade fantasma na Amazônia. Mas também é uma metáfora: visão sem feedback é fantasia; proteção sem pressão é estagnação. O setor automotivo brasileiro precisa parar de perseguir o próximo incentivo e começar a competir. Caso contrário, o sonho de grandeza industrial permanecerá apenas isso: um sonho, enferrujando na selva.




Imagem de capa: Imagem de OpenClipart-Vectors do Pixabay.



Artigo originalmente publicado no dia 22/06/2025, no Foundation for Economic Education.


Tradução, edição e adaptação por Felipe Lange.

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