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Sete formas de fortalecer o real (e melhorar a vida dos mais pobres)

Felipe Lange


Falar sobre os benefícios de uma moeda forte não vai ser a competência deste artigo, porque já há dois textos espetaculares sobre o assunto: esse e esse.


Ainda que nos dias atuais muitas pessoas estejam saindo das moedas fiduciárias para criptomoedas tais como o Bitcoin, o real brasileiro (assim como outras moedas fiduciárias) deve continuar hegemônico por um tempo ainda, pois tal processo será gradual.


Assim, o poder de compra da moeda nacional ainda será influente em nossas vidas por muito tempo ainda.


Neste artigo simples, vou compilar sete formas de deixar o real mais forte (ou menos desvalorizado), de maneira algo resumida. Vamos começar?



1. Aumento dos juros


Essa é a solução mais dolorosa e, dependendo do comportamento do banco central, pode demorar a dar resultados. É mais dolorosa pois uma redução no ritmo da expansão do M1 (ou mesmo uma contração do M1 por inteiro), demorará, no mínimo, alguns meses para começar a dar resultados. É o mecanismo básico da teoria demand-side, que vai atacar o problema pelo lado da demanda. O índice de preços irá cair com a queda da demanda pelos agentes econômicos e, no caso de uma contração na oferta monetária, pode ainda haver deflação de preços, dependendo da intensidade. Exemplos históricos tivemos no Brasil durante os anos 2002-2003 e nos Estados Unidos durante os anos 1979-1981. Outros efeitos envolvem a maior atratividade no carry trade, aumentando a demanda pela moeda doméstica. Após o choque contracionista, então os juros podem ser diminuídos. Dependendo da taxa de juros, é possível sim ter juros positivos atrativos e algum crescimento econômico, como ocorreu entre os anos 2003 - 2010.



2. Atrelar o real


Quando pegamos o termo em Inglês, há várias categorias do arranjo (ao menos segundo o FMI): crawling peg, conventional peg, stabilized arrangement, entre outros. O Brasil experimentou um arranjo residual disso durante a ditadura militar e, mais recentemente, nos primeiros anos do Plano Real (até janeiro de 1999). Além disso, há ainda arranjos atrelados onde não há controle da taxa dos juros, como ocorre hoje com Singapura. É um arranjo extremamente popular entre países subdesenvolvidos, por trazer credibilidade e alguma estabilidade monetária para investidores e consumidores. É por isso que é adotado em vários países africanos, tais como Costa do Marfim e Botsuana, assim como em países tais como o Paquistão e Vietnã.


De todo modo, o mais importante é a disponibilidade de reservas internacionais em relação ao M1. Se as reservas internacionais não forem o suficiente para honrar a taxa de câmbio determinada pelo banco central, pode ocorrer ataques especulativos e assim arruinar o arranjo. Os países do Sudeste Asiático (que hoje usam o regime flutuante), em grande parte, conseguiram se recuperar do trauma da Crise Asiática de 1997.



3. Câmbio fixo


Nesse arranjo, pode haver um Currency Board ou ao menos algo mais próximo possível dele (como acontece com alguns países do Oriente Médio). A moeda nacional é um mero substituto da moeda âncora, normalmente esta última sendo o dólar americano, embora haja casos envolvendo o euro.


Com a paridade cambial respeitada à risca, não há risco de ataque especulativo. Como o ataque à carestia se dá pela taxa de câmbio, o índice de preços cai com grande rapidez, provocando poucos traumas e sem necessidade de criar uma recessão, como ocorre em arranjos flutuantes com forte aumento nos juros. A Bulgária foi um exemplo histórico.



4. Liberar o dólar como moeda corrente


Além de imediatamente trazer uma opção a mais para consumidores e investidores, a opção de uma moeda como o dólar dentro do País traria mais conversibilidade ao real brasileiro, afinal as pessoas poderiam prontamente trocarem os reais por dólares, e vice-versa, aumentando a demanda pela moeda doméstica. Além disso, as taxas de juros básicas conseguem ser mais baixas, barateando os custos de empréstimos para investimentos produtivos. Exemplo é o Peru que, com o dólar circulando junto à moeda doméstica desde 2000, trouxe resultados muito bons, tão bons que não foi a primeira vez que o país teve inflação de preços menor até do que nos Estados Unidos. O nuevo sol peruano, moeda doméstica, também é relativamente estável, apesar das recentes turbulências em meio ao governo Pedro Castillo.



5. Usar o poder das palavras


Nesse caso, as palavras podem sim machucar. Quando uma das maiores autoridades econômicas de um país não se importa com a força ou a estabilidade da própria moeda, essa moeda seguirá um caminho de desvalorização, afinal os especuladores e agentes do mercado financeiro irão ganhar com os movimentos da moeda e, não necessariamente, com a desvalorização dela. Assim, com os sinais de que pode haver ganhos com a desvalorização (com uma mensagem inconsciente de "Podem apostar contra o real, não tem problema."), isso é o que acabará ocorrendo. Por outro lado, se o presidente ou alguma outra autoridade do governo (ou mesmo algum membro do próprio COPOM) abertamente defende uma moeda forte, a tendência se reverte. Não é que assim magicamente o real irá chegar aonde o governo quiser, mas sim que a sua tendência de valorização já se aparece.


Em exemplos brasileiros, tivemos o Gustavo Franco, que sempre defendeu moeda forte e, Henrique Meirelles, quando presidente do BCB, dizendo de que "a sua missão era proteger o poder de compra do real" e que a moeda é um bem público. Anos depois, quando ministro do extinto Ministério da Fazenda, disse que uma moeda estável é melhor do que quando está volátil. No estrangeiro, o Bundesbank (banco central alemão) sempre manteve o marco alemão na maior estabilidade possível, Ronald Reagan e seu secretário do Tesouro Donald Regan defendiam um dólar forte, assim como o próprio Paul Volcker. Robert Rubin, secretário do Tesouro durante o governo Clinton, falava que um dólar forte era interesse dos EUA e, mais recentemente, Jacob Lew falava sobre as vantagens de se ter uma moeda forte.



6. Passar reformas do lado da oferta


Não importa o país, melhorar o ambiente de negócios é sempre bom. Se você estimula a produção de mais bens e serviços por eliminação de barreiras institucionais e tributárias, naturalmente a demanda pela moeda irá aumentar. De 2019 para cá, apesar de menos do que se esperava, algumas pequenas reformas já impactaram na taxa de câmbio. Nesse início de ano, o real se apreciou com a aprovação da Lei do Ambiente de Negócios (ainda que tenha retornado à sua desvalorização). Isso inclui também reduções de impostos, o que sempre beneficiará tanto produtores quanto consumidores.



7. Não apenas falar, mas adotar


A retórica é importante, mas se ela não é levada a sério pelos investidores e consumidores, de nada adiantará. Se o governo se compromete a controlar os déficits ou em mesmo cortar os gastos na totalidade, a confiança aumenta (e uma de suas implicações é a chamada "incerteza gerada pelo regime"). Isso acontece porque, com as contas em ordem, haverá uma menor necessidade de se aumentar impostos e/ou aumentar o endividamento, este último pressionando na taxa básica de juros, afinal o governo estará absorvendo uma maior fatia da poupança do setor produtivo para custear o seu titã burocrático. É por esse motivo que a perda de grau de investimento interfere tanto na taxa de câmbio (como ocorreu recentemente na Colômbia) e, no caso brasileiro, há incertezas acerca da futura situação fiscal no País, que interfere na moeda. Há também o fenômeno da insegurança jurídica, que causa sempre distúrbios na taxa de câmbio.



8. É isso!


A moeda e a taxa de câmbio são variáveis extremamente importantes para serem ignoradas, afinal estão entre os principais fatores que irão aumentar (ou piorar) o padrão de vida dos mais pobres, assim como demonstrar como é o poder de compra dos habitantes daquele país ao longo dos anos (e também das décadas).


A taxa de câmbio irá interferir nos preços das commodities. Se você não come dólar, você come e usa commodities, em qualquer momento de sua vida cotidiana. O motorista de aplicativo que te leva para um encontro especial utiliza combustível: etanol e gasolina são commodities negociadas no mercado internacional. Chegado no encontro com a sua (ou o seu) pretendente potencial, você irá pedir um prato refinado, com peixes pescados na Noruega. Esses peixes, antes de chegarem até o seu prato, foram transportados com o uso de combustível e o importador teve de trocar os reais por dólares para comprar esses peixes, afinal o dólar é a moeda internacional de troca. O caminhoneiro está utilizando óleo diesel, que é petróleo. O biodiesel, que compõe parcialmente o combustível, vem da soja, que é também negociada no mercado internacional. A soja é transportada por outros caminhões... acho que podemos parar por aqui, não é?


Com a postura contracionista do Banco Central do Brasil, no ano que vem deveremos ver uma forte contração na oferta monetária. Isso pode beneficiar o real, apesar de o Fed já estar no caminho de uma postura falconista. Que a dita autonomia do banco central (que até o STF foi a favor) seja colocada em prática.



 

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