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Foto do escritorFelipe Lange

O que esperar do México com Obrador?

Atualizado: 3 de jul. de 2022

Parte 1: Os antecedentes

Felipe Lange


Antes de iniciar, cabe essa frase para reflexão (retirada daqui) e que acho extremamente precisa sobre o Brasil:


"[...]Jamais seremos prósperos, mas também jamais seremos péssimos. Jamais iremos para o liberalismo, mas também jamais iremos para o esquerdismo extremo. Se você observar bem o curso da nossa história, jamais tivemos propensão para nenhum dos lados. Igualmente, jamais tivemos propensão nem para a grandeza nem para a tragédia. Quando parece que estamos indo para a grandeza, surge algo e nos puxa de volta para mediocridade. Quando parece que estamos indo para a tragédia, surge algo e nos traz de volta para a normalidade. O que teremos eternamente, ao menos aqui no Brasil, é um feijão com arroz. Nunca iremos para o socialismo venezuelano ou cubano, mas também nunca iremos para o capitalismo suíço ou mesmo americano. Ficaremos sempre em cima do muro. Prosperaremos em relação aos nossos vizinhos mais socialistas (Equador, Bolívia, Venezuela e Argentina), mas ficaremos para trás em relação ao resto do mundo. Há o lado bom desta nossa inércia: jamais seremos Cuba ou Venezuela. Mas há o lado ruim: jamais seremos desenvolvidos. "


Antes de abordar em detalhes sobre o que está sendo feito no governo atual de Andrés Manuel Lopez Obrador, temos de ver os antecedentes. Por este motivo, neste artigo iremos abordar os seus três antecessores, assim como fazer um breve histórico sobre o México herdado no começo deste século XXI.



O que o antecedia


O México tem muitas similaridades com o Brasil. Uma republiqueta bananense, marcada por instabilidades políticas e corrupção (possivelmente piores do que o do Brasil, com narcotraficantes violentos no interior do país), que também teve um período breve de câmbio atrelado (o peso mexicano, que é uma moeda mais antiga que o real, tendo nascido no século XIX, quando ainda era utilizado como moeda de ouro) que trouxe alguma estabilidade econômica. Antes do arranjo atrelado, ele era um câmbio fixo, como era grande parte do mundo durante o acordo de Bretton Woods, quando ele abandonou de vez o regime, em 1976¹. É possível que ele estivesse sofrendo dos mesmos problemas que o Brasil com o seu arranjo gambiarra, em querer fixar o câmbio e expandir a base monetária, assim sobrevalorizando a moeda doméstica, o que é na prática um pseudo-câmbio fixado. Em 1988 nasceria o arranjo cambial atrelado, durando assim até 1994, quando ocorreu a chamada Crise do México (praticamente em simultâneo com a tomada de territórios pelos zapatistas, um grupo guerrilheiro). À partir de então, o câmbio passou a ser flutuante.


A Bolívia, surpreendentemente, continua com o seu arranjo de câmbio atrelado intacto (está assim desde o fim de 2008) , talvez por não ser relevante o bastante para ser alvo de ataques especulativos. Isso acontece porque por lá o boliviano não é transacionado livremente no mercado financeiro, assim como os bolivianos não são livres para comprar dólares como os brasileiros. Entretanto, como o governo boliviano está queimando as reservas para tentar manter o arranjo cambial, algo que tem ocorrido desde a queda dos preços internacionais do gás natural (dos quais o governo é dependente), há um risco de o arranjo acabar indo para o flutuante.


O arranjo cambial atrelado é até hoje relativamente popular, principalmente em países com pouco protagonismo na economia mundial. Ele hoje também existe em países como Iraque, Haiti e Egito.



Quase em simultâneo ao início do câmbio atrelado, os gastos governamentais mexicanos caíram em mais de 20 pontos percentuais.



Entre os problemas crônicos do país, estão a corrupção e a criminalidade, esta última causada por um problema histórico de guerra contra as drogas (e com envolvimento também do governo americano). Há poderosos cartéis, como o cartel de Sinaloa (com o líder Joaquín "El Chapo" Guzmán, que no momento está na sua terceira prisão, após várias fugas; vídeo de sua captura, digno de uma partida de Counter-Strike), Los Zetas,

Los Caballeros Templarios e Cártel de los Beltrán Leyva.


Apesar dessas encrencas, o México, além de um importante exportador para países como os Estados Unidos através do acordo comercial NAFTA (o sedã Jetta, até um tempo atrás, era exportado para a Europa, entretanto acabou saindo de linha pois o europeu médio não compra sedãs desse porte, preferindo hatchbacks ou peruas; continua sendo enviado para os Estados Unidos), tem avançado em pontuação de liberdade econômica, acima da média mundial, ao passo que o Brasil tem se mantido abaixo da média, piorando consideravelmente nos últimos anos. Em PIB per capita, o país também passou o Brasil, estando em uma situação relativamente boa ao ser comparado com outros países vizinhos. Não está em nível chileno ou panamense, mas está no caminho.


Ao passo que o Brasil fica preso ao arranjo bizarro e atrasado do Mercosul, que sequer permite a livre venda de carros vendidos nos países vizinhos, o México se beneficiou do NAFTA. Embora o arranjo não seja ideal, consegue ser melhor do que o caminho que foi tomado pelo Brasil.


Comparação entre Brasil, México e mundo. Gráfico do Índice de Liberdade Econômica do Heritage.



PIB per capita, 1960 até 2016, entre Brasil e México, ajustado para inflação e diferenças de preços entre países. Brasil cresceu forte após 2003, o que trouxe um forte efeito psicológico e reelegeu Lula.


PIB per capita de 1960 a 2016, comparando Brasil e México com Bolívia, Paraguai, Equador, Peru, Colômbia, Uruguai, Argentina, Chile e Panamá. Panamá é um dos poucos (senão o único) a não possuir um banco central e usar o dólar americano como moeda corrente. Argentina cresceu forte na década de 90 graças ao câmbio fixo. Uma das comprovações empíricas do poder de uma moeda forte.



Antes do Peña...


Tentarei resumir o que foi feito nos dois primeiros governos do novo século, simplesmente não apenas por uma menor disponibilidade de dados, mas também pelo fato de que o detalhamento será feito no governo Peña, dado o fato de que é mais fácil achar por dados recentes (e sei mais Inglês que Espanhol).


Antes de prosseguir, uma coisa deve ser esclarecida: os mandatos presidenciais duram seis anos, mas não é permitida a reeleição do mesmo presidente. Pronto? Vamos lá.


Comecemos por Vicente Fox. Vicente quebrou a hegemonia de 71 anos de poder do partido anterior, Partido Revolucionario Institucional (agora o partido seria o Partido Acción Nacional). Ele teve um histórico de sucesso dentro da Coca-Cola, quando havia começado como motorista da companhia e se tornou depois presidente da sede mexicana da empresa. Ao assumir em no dia 1 º de dezembro de 2000, ele herdou um país com economia relativamente arrumada, fruto das amplas reformas feitas após 1989, quando foi feito um severo corte de gastos, além de ter buscado uma moeda forte com o câmbio atrelado do peso mexicano, o que consequentemente resultou em um crescimento econômico alto (principalmente industrial), além de o desemprego ter chegado a níveis praticamente suíços.


Em questão econômica, o câmbio se manteve praticamente inalterado, com valores ao redor de 10 pesos por dólar (apesar do estouro da bolha de empresas pontocom), o desemprego se manteve baixo (embora tenha passado um pouco de 4% após 2002), os déficits atingiram valores bastante baixos (e que mantiveram o legado de país com grau de investimento, algo que o Brasil não recuperou desde 2015), houve um crescimento forte mesmo com a recessão após o estouro da bolha pontocom, a pontuação geral de liberdade econômica se manteve quase sem mudanças (embora ligeiramente abaixo do medíocre), os frutos do NAFTA continuaram sendo gostosos e o PIB per capita cresceu forte (mais do que o Brasil no primeiro mandato do Lula), em um ritmo maior do que foi o Brasil no "milagre econômico", sem precisar trazer uma posterior década perdida.


Considerado um político de direita, ele até defendeu a liberdade de preços para os combustíveis (algo que nem ele, nem o sucessor Felipe Calderón conseguiram). Um de seus grandes pontos fracos é que ele defendia aumento de impostos (em alimentos e remédios, uma pornografia, além de imposto de renda para "combater a desigualdade social"), o que não apenas é imoral, como causa grandes estragos econômicos e sociais.


E o Felipe?


Felipe Calderón foi quem antecedeu Enrique Peña (e sucedeu Vicente Fox), do mesmo partido. Ao contrário do antecessor, ele sempre guiou a sua vida pela política, militando em favor do Partido Acción Nacional.


Em seu governo, analisando por questão econômica pura, pouca coisa também mudou. Houve uma maior regressão em sua posição de liberdade econômica, a economia continuou crescendo de maneira robusta (embora a taxa de desemprego tenha continuado a subir), a taxa de câmbio começou a se desvalorizar lentamente e a inflação continuou controlada (praticamente a mesma coisa do que no governo anterior).


Entre algumas medidas tomadas por ele, destaco essas duas:


(1) Um bizarro programa de controle de preços para o setor de tortilhas. Claro que é para beneficiar um certo setor da categoria. Isso é mais velho do que Fidel Castro.


(2) Um programa de emprego. Denominado "Programa del Primer Empleo", sendo nada mais do que o Contrato Verde e Amarelo mais enxuto (e sem depender de votação de congresso), cujo objetivo principal era levar as pessoas rumo ao primeiro emprego (incluindo graduados). Consistia em basicamente isentar ou descontar os impostos da seguridade social pagos pelos empregadores, para incentivar o emprego e, também, de tentar evitar a saída de mexicanos para os EUA, assim como tirar pessoas da informalidade, que é um setor também grande no México. Embora seja dito de que o governo estaria subsidiando, na verdade está errado: se a empresa deixa de pagar impostos na seguridade social, então não é um subsídio - que seria o governo tomar de um e dar para outro -. Aqui, é basicamente uma isenção ou desconto nos impostos. O programa visava atingir também as mulheres que nunca conseguiram um emprego pois, segundo ele, o emprego seria um meio de libertação delas (certamente muito mais libertador do que ver tuítes feministas). Só que ele englobou vários setores, incluindo setores industrial, serviços, turismo, restaurante, entre outros. Entrou em vigor em março de 2007. Lembram-se de que disse que o desemprego estava continuando a subir? Então, o problema é que, como o mandato dele foi acometido pela crise de 2008, é difícil saber se, empiricamente, o programa deu resultados na diminuição de desemprego. Entretanto, dado de que os custos trabalhistas do país diminuíram com a adesão ao programa, então já foi um avanço importante. Até alguns anos atrás, a legislação trabalhista mexicana era considerada pior do que a brasileira.



Pontuação em liberdade econômica no mercado de trabalho, entre Brasil e México (obtido aqui). Imagem obtida por um recorte, após captura de tela. Prestem atenção que, embora o Brasil tenha começado a cair de 2009 em diante, caiu forte após 2013. O motivo? Possivelmente isso.


Nossa sorte: pelo menos Lula não quis torrar dinheiro na guerra contra as drogas no México



O problema veio com os déficits, que simplesmente explodiram em 2009, pouco mudando até 2012, o último ano de seu mandato. Uma das causas, além da crise internacional de 2008 (pois aumenta o desemprego, diminui a "arrecadação" estatal e aumenta as despesas com seguridade social), é que os gastos militares, que se mantiveram inalterados no governo Fox, explodiram com Calderón. O motivo? Agora vamos à outra encrenca.



Uma guerra interna


Felipe foi mais um dos governantes que tentou entrar na aventura de guerra contra as drogas, o que deixou um legado de matança em seu governo, tendo um alto custo político, embora até hoje ele tenha um grande número de seguidores (no Twitter ele possui 5,7 milhões de seguidores, ao passo que Bolsonaro possui 6,5 milhões de seguidores, o que é considerável dado o fato de que a população mexicana é de aproximadamente 126 milhões de habitantes). De fato, o problema de guerra contra as drogas é histórico no país mas foi em 2006, no início de seu mandato, que isso foi intensificado, com envolvimento do governo americano (pelo menos o Brasil é soberano nessa parte, já que quem patrocina os conflitos são os governos locais). Um forte concorrente para os filmes do Tropa de Elite. O saldo de mortos nessa carnificina foi de pelo menos 200 mil pessoas. Além de haver vários cartéis poderosos de drogas, teve até furto de gasolina para revenda no mercado ilegal como um outro exemplo de atividade ilícita, o qual gerou prejuízos bilionários para a Pemex (que, por ser estatal, obviamente iria repassar esse prejuízo para os pagadores de impostos). Esse é outro exemplo de uma das práticas sádicas dos bandidos envolvidos nos cartéis de drogas, além de estupros, torturas, abusos e degolas. O resultado é que, após anos de estabilidade (ou mesmo declínio) na taxa de homicídios, a taxa voltou a disparar.


A dívida explodiu logo após 2008:


Dívida em relação ao PIB, de 1990 até 2018.


Em parte econômica, ele não deixou nenhuma herança maldita, a não ser as dívidas e déficits crescentes, como se isso já não fosse grave. Para ser justo, isso foi em grande parte causado pela crise de 2008, pois o orçamento militar, embora tenha aumentado bastante em seis anos (por volta de 42%, se levado em conta com o orçamento em relação ao PIB), continuou baixo. O que pode explicar também a explosão dos déficits foi a situação na qual a Pemex se encontrou, quando ela perdeu as suas receitas após o barateamento dos preços internacionais do petróleo (eis as exportações em milhões de dólares, de petróleo e exportações totais, de janeiro de 2008 a janeiro de 2010; irei abordar sobre as receitas da Pemex no próximo artigo), pois a crise fez o petróleo cair de preço, com o temporário aumento no índice DXY, ou seja, da força do dólar perante às principais moedas do mundo. Em questões sociais e políticas, ele jogou os problemas de criminalidade e, também, da corrupção endêmica, para o sucessor.


Felipe, na campanha, foi um defensor de redução de imposto de renda (mas não houve nenhuma redução significativa, e sim uma redução ínfima e depois um aumento novo nas alíquotas) e, anos depois, defensor de descriminalizar a posse de cocaína em quantidades restritas (além de heroína, maconha e metanfetamina). É óbvio que o governo americano, um dos interventores nessa sangrenta guerra contra as drogas, foi contra. Afinal, a quem interessa essa guerra contra as drogas?



Que Peña...


O antecessor do atual presidente, Enrique Peña Nieto, jovem à época para um cargo como tal (com apenas 46 anos, um pouco mais velho que Fernando Collor), que governou o país de 2012 a 2018, seria eleito com uma discreta vantagem sobre o concorrente insistente, Andrés Manuel López Obrador. Eleito sob o partido Partido Revolucionario Institucional, o qual ficou no poder no México de 1929 a 2000 (portanto, uma volta do partido ao poder), não se sabe ao certo as suas posições filosóficas e econômicas. Vamos considerá-lo como "centro-direita", como alguns meios de comunicação já disseram.


Bastante otimismo por parte de Michael Crowley...

Capa da revista Time de 24/02/2014.



Em seu mandato, comecemos pela sua pior medida:


(1) Aumentou a alíquota do imposto de renda, de 30% para 35%. Parece pouco se medido em pontos percentuais, mas em porcentagem, na prática, a tributação aumentou em 16,6%. Ele defendeu impostos sobre faixas de renda mais alta, para financiar coisas como a Previdência, assim como outros gastos. Até os chamados junk food, alimentos industrializados e calóricos, foram mais tributados. Além disso, tributou ganhos de capital e acabou com as deduções e brechas que reduziam o espólio tributário. Como não é surpresa, a dívida governamental subiu de 33,8% para 46% do PIB (embora os déficits tenham caído, mas notem que eles caíram após 2015, e não após 2013, que foi quando o aumento dos tributos foi aprovado). Esse tipo de falso ajuste não funciona, como fica comprovado pela teoria e empiria.



Entretanto, houve essas medidas...


(1) Criou as zonas econômicas especiais: feitas para os estados do sul do país, essas zonas simplesmente ganharam isenções tributárias, assim como benefícios alfandegários e simplificação regulatória. E cuidado para não confundir isenções com subsídios.


(2) Integrou-se e deu continuidade à Aliança do Pacífico, juntamente com Peru, Colômbia e Chile. Em 2017, o México ficou na 46 ª posição de 75 países analisados em abertura comercial. É medíocre, ficando à frente de países como Grécia, Tailândia e África do Sul, mas não está muito atrás de Itália (45 ª posição), Estados Unidos (40 ª posição) e Coreia do Sul (39 ª posição). Brasil está na 69 ª posição.


(3) Desregulou o setor energético, ainda que de maneira leve. Embora a Pemex (versão mexicana da Petrobras) tenha permanecido estatal, os subsídios à gasolina foram reduzidos e foi extinto o monopólio estatal sobre o petróleo. O problema é que o fim dessas distorções provocou o aumento nos preços do combustível, que posteriormente causaria os protestos em janeiro de 2017, liderados por Obrador (de novo ele!), naquele fenômeno de que o grosso da população não sabe Economia, então qualquer política populista de subsídios terá suporte popular. Um consolo: os preços da gasolina estão em baixas históricas, menores do que em alguns anos com esses subsídios (notem que o combustível passou a oscilar mais depois de 2013). Levando em conta de que os mexicanos são mais ricos (ao menos em PIB per capita), então pode-se dizer de que até eles pagam mais barato do que nós pela gasolina (e que não é vendida naquela pornográfica mistura com 27% de etanol, usando uma proporção menor até do que em outros países desenvolvidos, de 5,8% de etanol). Enrique é bem-intencionado, mas como o dólar à época já estava mundialmente forte, provocando uma queda nos preços do petróleo, então ficou muito menos atrativo para petroleiras estrangeiras investirem nesse setor. Não teve culpa ele, afinal os presidentes anteriores não fizeram isso, quando o dólar estava vivendo dias mais difíceis. Os próprios subsídios ao combustível estavam gerando um descontrole fiscal, sendo portanto uma outra razão para terem sido cortados. Poderia ser menor se os impostos não fossem tão altos (só perdem para o Brasil e sua tributação norte-coreana). Além dos subsídios, foram abolidos os controles de preços.


Essas estão entre as medidas mais relevantes.


Os déficits, que foram se acumulando em altas e mais altas, mostraram algum recuo (o que não pode ser creditado ao aumento da carga tributária, já que ele tirou os subsídios caros ao combustível da Pemex):


Os déficits de 2018 também incluem o breve início do governo de Obrador



Uma das consequências é que o país continuou com o seu grau de investimento, o que, reitero, o Brasil não recuperou desde 2015. O país de Língua Portuguesa só começou a diminuir a sua dívida em 2019, o que nesse ano vai ser revertido, dado o fato de que nenhum governante, nem o governo federal, está empenhado em cortar despesas durante esse caos.


Em questão cambial, o peso mexicano se manteve relativamente estável, até que em outubro de 2014, com o dólar começando a ficar mundialmente forte, começa a se desvalorizar continuamente, indo de uma taxa de 13,4 pesos por dólar, até chegar o pico de 20,8 pesos em janeiro de 2017, conforme demonstra gráfico abaixo:



Só que, ao contrário do Brasil, onde o real começou a afundar após o começo de 2018, o peso mexicano, desde o pico de desvalorização em janeiro de 2017, só se valorizou até o fim de 2018, apesar da eleição de julho do Obrador do mesmo ano:


Ao passo que o dólar americano encareceu por volta de 12% em relação ao real (linha vermelha), ele barateou 7,81% em relação ao peso mexicano (linha azul). Gráfico que vai de janeiro de 2017 até janeiro de 2019.



Agora separemos os gráficos:


Taxa de câmbio entre dólar americano e real brasileiro, de janeiro de 2017 até janeiro de 2019.


Taxa de câmbio entre dólar americano e peso mexicano, de janeiro de 2017 até janeiro de 2019.


Uma das razões é que, enquanto no Brasil os juros perderam atratividade no começo de 2018 para os juros americanos (pois a taxa americana de juros voltou a subir), no México foi o contrário, onde teve uma subida contínua:


Taxa de juros brasileira, de janeiro de 2017 até janeiro de 2019.



Taxa de juros mexicana, de janeiro de 2017 até janeiro de 2019. Como houve um erro técnico por parte do Trading Economics, então elaborei por conta própria, usando os dados daqui.


Taxa de juros americana, de janeiro de 2017 até janeiro de 2019.



Falaremos mais dos juros mexicanos posteriormente.


Em questão de crescimento econômico, o México também se comportou razoavelmente bem, sem chegar a ter uma recessão durante o período.


Crescimento anual do PIB. Gráfico que vai de dezembro de 2012 (mês de posse de Peña Nieto) até 30 de novembro de 2018, último dia do mandato (posse de Obrador seria no dia primeiro de dezembro do mesmo ano); mandato presidencial no México dura 6 anos.



Os salários também seguiram uma tendência linear de crescimento, ao passo que no Brasil os salários sofreram uma pancada depois da crise econômica de 2014, recuperando-se só depois. Em dezembro de 2012, o salário no México estava em 270,91 pesos por dia. Em dezembro de 2018, foi para 354,35 pesos por dia. Em seis anos, o salário médio aumentou 30,79%.


Salário diário em pesos mexicanos, de 2000 até começo de 2020.



Em inflação acumulada pelo índice de preços ao consumidor (ou no Inglês Consumer Price Index), foi de 80,57 pontos em dezembro de 2012, para 103,02 pontos em dezembro de 2018. Inflação de 27,86% em seis anos. Ou seja, descontando o aumento salarial pela inflação, houve um aumento real de 2,93%. Bem baixo, não é?


No Brasil, o salário mensal de dezembro de 2012 estava em R$ 2224. Em dezembro de 2018, R$ 2346. Assim sendo, o aumento salarial foi de 5,48%, em seis anos. A inflação acumulada, de 41,58% (pelo mesmo índice de preços)². Uma queda real de - 36,1%. O salário, para pelo menos estar corrigido pela inflação, deveria estar em R$ 3148. Os funcionários estatais, pelo contrário, sofreram constantes aumentos acima da inflação.


Levando em conta de que a média de dias de trabalho no México é de 253 dias por ano, basta dizer que, por mês (que estão em uma média de 21 dias de trabalho), o salário em dezembro de 2012 estava em 5689,32 pesos. Em dezembro de 2018, o salário ficou já em 7441,35 pesos.


Fazendo conversão cambial, obtemos assim:


- O salário em dezembro de 2012, convertido à taxa cambial de 03/12/2012 de 12,95 pesos por dólar, obtemos então um salário de US$ 439,32. Em dezembro de 2018, à taxa cambial de 03/12/2018 de 19,67 pesos, o salário convertido ficou em US$ 378,30 pesos. Uma desvalorização de 13,88%.


- Para o Brasil, usando-se as mesmas metodologias (incluindo a mesma data de taxa cambial), obtém-se um salário em dezembro de 2012 de US$ 1084 dólares. Em dezembro de 2018, esse salário passa a ser de US$ 604,63 dólares. Uma desvalorização de 44,23%.


Ou seja, ao passo que em termos de salário médio o Brasil permanece mais rico do que o México (notaram como em PIB per capita estava diferente?), essa diferença entre ambos os países diminuiu muito ao longo dos anos. Esse é só um dos vários mensuradores de uma riqueza de uma determinada nação, mesmo porque a prosperidade de uma região se mede principalmente pela abundância de bens e serviços, não necessariamente pelo salário.


Agora chega de comparar com o Brasil, e vamos aos demais dados importantes sobre o México.


A taxa de desemprego, que havia atingido a alta histórica do século de algo ligeiramente menor que 6%, pouco antes de 2010, seguiu uma trajetória de queda contínua, indo de 4,4% em dezembro de 2012 para 3,4%. Não atingiu ainda os níveis quase escandinavos no fim da década de 90, mas está muito bom para um país de perfil latino-americano. Talvez a metodologia seja diferente da usada no Brasil, mas é notório o baixo desemprego. É possível que, no entanto, o país tenha sido influenciado por um vasto mercado informal, o que tende a diminuir as taxas de desemprego, já que o informal normalmente para de procurar emprego e não pressiona as estatísticas. É possível que tenha sido fruto da pequena reforma feita no mercado de trabalho feito pelo Calderón.


Taxa de desemprego de dezembro de 2012 até dezembro de 2018.


Série histórica de taxa de desemprego, indo de pouco antes de 1995 até começo de 2020.


Embora a produção industrial tenha se mantido em um ritmo de crescimento pouco diferente dos governos anteriores (exceto ao comparar com a década de 90), a produção de veículos aumentou consideravelmente.



Hoje o país, além de exportar Volkswagen Jetta para os Estados Unidos, exporta o Toyota Yaris (que originalmente é um Mazda 2, mais um daqueles carros que fazem bastante falta para os brasileiros, que precisam se contentar com alguns poucos carros decentes e bem caros). Alguns carros mexicanos também foram e ainda são exportados para o mercado brasileiro.


Um dos exemplos foi o Ford Fiesta de sexta geração. Embora para cá ele tivesse sido exportado carecendo de vários itens de segurança (o que não ocorria quando ele era exportado para os americanos; este fenômeno expliquei aqui), ele era um carro bastante sofisticado para a época. Depois de ter sido nacionalizado em 2013 junto com a reestilização, perdeu consideravelmente em qualidade. O painel superior, que no modelo mexicano era todo em plástico macio (com espuma por baixo), passou a ser inteiramente de plástico rígido no nacional. Entre outras depenações, o para-brisa deixou de ter também o isolamento acústico. O interior do carro, que já era simples, perdeu em qualidade. No ano passado, o carro saiu de linha para o mercado brasileiro, e pelo jeito continuaremos sem os bons carros europeus. A vida de entusiasta automotivo no Brasil, que já não era tão boa, está ficando cada vez mais chata.


Modelo mexicano do Ford Fiesta. Versão de topo.


As exportações desse setor de carros aumentaram mas, não apenas nessa categoria, mas todo o setor exportador cresceu, como pode ser comprovado abaixo:



Como é fato de que boas indústrias precisam de bons insumos, e uma parte desses insumos é importada, o setor importador também cresceu:



Em resumo, a economia mexicana se comportou relativamente bem desde a reforma do fim da década de 80, tendo se desempenhado de maneira respeitável perante os vizinhos.


Apesar disso, problemas como a corrupção e criminalidade continuaram incomodando e isso foi um dos pesos para a eleição de Obrador, com uma retórica bastante populista.


A segunda parte pode ser consultada aqui.


 

¹ Conforme a monografia entitulada "Inflation and Exchange Rate Regimes in Mexico", de Carmen A, Li Apostolis Philippopoulos e Elias Tzavalis.


² Usada a mesma metodologia que no México. No Brasil, foram obtidos 3602,46 pontos em dezembro de 2012. Em dezembro de 2018, saltou para 5100,61 pontos. Inflação de 41,58% em seis anos.

 

Recomendações (fortes) de leitura:


 

Imagem retirada do livro "Florentine Codex", do frade Bernardino de Sahagún.

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