Felipe Lange
No dia 15 desse mês de fevereiro, o jornal Valor Econômico publicou a notícia, intitulada "Brasil recua em ranking de liberdade econômica da Heritage Foundation" (sua íntegra pode ser acessada aqui).
Neste artigo, farei uma espécie de checagem de fatos da maneira mais imparcial possível. Lembre-se que o autor não está recebendo nenhum tipo de patrocínio para fazer esse artigo (quem dera se recebesse para escrever...).
Utilizarei o ranking mais recente lançado pela instituição, ou seja, o de 2022.
Item 1: O Brasil está na 143ª posição no ranking de liberdade econômica e piorou
Sim, isso é um fato, entretanto isso é referente ao ranking de 2021, no relatório do Heritage Foundation. Como a fundação já lançou o ranking de 2022, a redação do jornal deveria ter se atentado a isso e então se atualizado.
No ranking de 2021, o período abordado foi da segunda metade de 2019 até a primeira metade do ano de 2020 (ver página 464 do relatório). Assim, o ranking de 2022 abordará a segunda metade do ano de 2020 até a primeira metade do ano de 2021.
Portanto, nos dados mais recentes, o Brasil está na 134ª posição no ranking. De fato sim, houve uma piora: ao passo que no ranking de 2021 o país estava com 53,4 pontos, no ranking mais atual, o país ficou com 53,3 pontos. Em níveis gerais, o país piorou desde o ranking de 2020.
Isso, todavia, não quer dizer que nesse ínterim o país não tenha melhorado em certos itens. Um dos exemplos foi a liberdade de se fazer negócios: no ranking atual, está em 63,2 pontos, o maior valor desde 2005. A questão é que essa melhora não foi capaz de compensar as pioras em outros itens abordados na pontuação.
Item 2: O Brasil fica atrás de países como Colômbia, Paraguai e Uruguai no ranking
Sim, é fato e é ainda pior: entre os países latino-americanos, o Brasil só ganha de Argentina, Haiti, Suriname, Bolívia, Cuba e Venezuela. Não estou brincando: perdemos para todos os demais países americanos.
Item 3: Singapura é líder no ranking
Por muitos anos, Hong Kong era o país líder no ranking. Entretanto, como Hong Kong perdeu todo o restante de sua autonomia para o governo chinês nos últimos anos (conforme relatado aqui), o país saiu do ranking, então tendo o seu posto ocupado por Singapura.
Item 4: Brasil fez pouco em medidas como a abertura comercial e as privatizações
Estão certíssimos: em abertura comercial, o Brasil permanece na vergonhosa posição entre os países mais fechados do mundo. Apesar de algumas desonerações pontuais em itens e em consoles de videogames, no geral o país avançou pouca coisa. E também fica ainda pior: a queda na pontuação de liberdade comercial (que seria o "Trade Freedom") tem ocorrido desde 2019. Nesse item em específico, é mensurado as tarifas de importação médias, barreiras não-tarifárias, controles de capitais, etc.
Elaboração própria do gráfico (pontuação máxima é de 100). Fonte: Heritage Foundation Economic Freedom Index.
Estando entre as economias mais fechadas do mundo e com o governo temendo lobbies mercantilistas (basta ver essa declaração do Paulo Guedes, que disse que "não irá acabar com a indústria em nome da abertura comercial"), isso não deverá mudar por aqui tão cedo. Deveremos ficar com tarifas norte-coreanas em nome dos lucros das grandes corporações.
Em matéria de privatizações, realmente a matéria faz uma crítica correta. Todavia, infelizmente privatizar as estatais de controle federal ficou ainda mais difícil nos últimos anos.
Isso porque, ainda em 2018, o Supremo Tribunal Federal havia feito uma liminar, a qual proibiria o governo de privatizar estatais sem a autorização do Congresso (à pedido de sindicatos). Então, em 2020, houve a decisão final do Supremo, que autorizou a venda de algumas subsidiárias (como a da Petrobras), com muitas estatais dependendo de permissão do Congresso para serem privatizadas. Estatais como a CEITEC não dependem dos congressistas, dado o fato de que a empresa já está em processo de liquidação.
Caso quiser saber de algumas das privatizações já feitas no governo Bolsonaro, sugere-se a leitura desse artigo.
Críticas sim, mas com fundamento
Muitos meios de imprensa tradicionais, infelizmente, acabam que tecendo críticas injustas ao governo na parte econômica. Nessa matéria em específico do Valor Econômico, poderia por exemplo ter sido a parte fiscal, que está em um patamar extremamente preocupante. Isso porque, segundo o mesmo relatório do Heritage de 2022, o Brasil ficou com apenas 0,4 ponto na saúde fiscal (que seria o Fiscal Health), pior valor registrado na série histórica (que começou para 2017). Os Estados Unidos também preocupam, já que o país recebeu a vergonhosa nota 0, o que de certa forma foi previsto neste artigo por Ryan McMaken. Assim, o Brasil fica atrás de países como Peru (73,1 pontos), México (78 pontos), Chile (75,3 pontos) e Grécia (67,6 pontos).
Devemos criticar alguma política econômica no governo? Sim, em qualquer governo de absolutamente qualquer economia, não importando a sua vertente ideológica.
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