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Foto do escritorFelipe Lange

Por que alguns remédios dos EUA são tão caros

Atualizado: 9 de jun. de 2020

Gilbert Berdine


Nota inicial do tradutor: Quando ainda estava ainda em Lake Worth Beach, no meu plano de saúde Florida Blue (não é nem para fazer publicidade, porque não estou ganhando nem um centavo de bolívar com isso) uma das diferenças notáveis era com relação aos medicamentos prescritos. Eu confesso de que estava com medo, porque temia de que fosse mais um processo burocrático e chato, ainda mais diante de um perigo de se contaminar com tantos desinformantes sobre os EUA (cuidado: eles fazem muito mal à saúde). Embora também haja a bizarra restrição de compras por tipo de medicamento, por mês (você não pode comprar mais do que o previamente determinado na prescrição médica por mês), já consegui perceber algumas diferenças.


Enquanto no Brasil era coisa de dez minutos para mais para comprar um monte de caixa de remédio porque o coitado do farmacêutico precisa, além de preencher um carimbo à caneta e de maneira repetitiva, reter o papel da receita, de forma que você tem que ficar levando esse troço a todo momento que for comprar o que precisa. Na Flórida, pelo menos na minha experiência, ao passo que é algo um pouco burocrático e pode demorar para conseguir o primeiro atendimento com o seu plano de saúde, depois obter os remédios é algo prático: simplesmente pedia o remédio manipulado pelo aplicativo (no caso a Walgreens) e no dia seguinte (ou no próximo) ia pegar. Puxa vida! Mamãe nem acreditou que eu estava tomando um remédio manipulado sem ter um surto como efeito colateral, dada a maravilhosa qualidade das coisas feitas para os brasileiros. Dava também para ligar, mas o aplicativo é bem melhor. Embora o medicamento para aquele mês (30 cápsulas) custava, se não me falha a memória, algo como US$ 500, com o plano, ele ficava em US$ 10. A farmácia Walgreens também era de excelência, tendo como único ponto fraco uma eventual demora no atendimento, por falta de funcionário... se eles tivessem me contratado, já que era quase do lado de casa...


O que achei esquisito é que, um tempo depois, recebi um comunicado da seguradora de saúde que, à partir de certa data, eles cobririam menos doses de certos medicamentos (menos opções de dose por cápsula, por exemplo não cobrindo mais o remédio de 225 mg, mas cobrindo remédios de 75 e 150 mg), para cortar custos, o que exigiria que eu usasse duas caixas do mesmo medicamento, como eu fazia no Brasil. Ou seja, embora os planos de lá sejam infinitamente melhores do que os que via no Brasil (pelo menos comparando com o que eu tinha no Brasil), eles devem estar sofrendo com os crescentes custos regulatórios ou mesmo com a inflação, embora a inflação americana seja bem mais civilizada do que a brasileira. Com relação aos medicamentos de minha dermatologista (foi a única que começou a resolver o meu crônico problema de acne), era ainda mais gostoso: como eles não tinham na cidade, eles chegavam por correio e não custavam nada (vinha do Texas, sendo entregues pela estatal de correios USPS). Tudo que eu tinha que fazer era, depois de receber a remessa, preencher o papel, colocar em um envelope e mandar (lá você pode deixar o envelope na caixa, de pé, que o carteiro irá pegar; sim, ainda existe civilização lá, ninguém vai furtar a sua caixa de correio, que está exposta na calçada), para avisar à farmácia que eu tinha recebido. E eles mandavam no outro mês. Ela, assim como todos os médicos do meu plano, nunca se atrasou. Nada de atrasos de duas horas, uma hora e afins, como eu via por aqui. Mamãe muito bem sabe o que é isso.


Será que com o coronavírus e um maior risco de contágio com esses procedimentos de pegar papel e preencher carimbos para pegar medicamentos prescritos, os burocratas brasileiros vão aproveitar para desregular isso, ou ficaremos nesse atraso soviético?


E tudo isso acima, apesar de ter sido uma experiência positiva, não invalida os problemas existentes na saúde americana: regulações. Agora vamos mostrar um outro fenômeno na saúde americana: alguns medicamentos extremamente onerosos.

 

Digite "preços absurdos de medicamentos" no Google e você receberá muitos exemplos. Conforme relatado aqui, a Marathon Pharmaceuticals planejava cobrar US$ 89.000 por ano por sua marca Emflaza do corticoide deflazacorte. O deflazacorte foi introduzido em 1969 e está disponível fora dos EUA por menos de US$ 2 por comprimido. Pacientes norte-americanos com distrofia muscular obtêm o medicamento por cerca de US$ 1.500 por ano de fontes estrangeiras. Esse comportamento de preços não pode ocorrer em um livre mercado. Em um mercado livre ou sem impedimentos, se a Marathon tentasse cobrar US$ 89.000 pelo fornecimento de um ano de deflazacorte, eles obteriam zero vendas. Existem pelo menos 169 fabricantes de genéricos de pelo menos 300 marcas de deflazacorte. Um ou mais concorrentes da Marathon teriam prazer em fornecer a droga por um preço mais baixo. Em uma situação com forte concorrência, o preço passará para o custo mínimo de produção mais transporte ao longo do tempo. A Marathon pode tomar sua decisão de preço e espera conseguir vendas, porque uma agência governamental concedeu ao Marathon o privilégio de vender o deflazacorte nos Estados Unidos. O debate sobre se as patentes de medicamentos são benéficas para a sociedade está fora do escopo desta discussão. Os defensores do privilégio de monopólio para produtos farmacêuticos devem admitir, no entanto, que o privilégio de monopólio permite preços exorbitantes. No caso de Emflaza, a Marathon não desenvolveu um novo medicamento. Deflazacorte está em uso desde 1969. O FDA concedeu privilégio de monopólio à Marathon Pharmaceuticals por adquirir dados antigos de ensaios clínicos e realizar algumas análises adicionais. O privilégio de monopólio permite preços que extraem a última parte da renda disponível dos clientes, mas o monopólio não pode, por si só, extrair mais de um cliente do que o cliente pode pagar. O elemento final da política necessário para o preço ultrajante de US$ 89.000 para um suprimento de um ano da Emflaza é o financiamento público. Por financiamento público, quero dizer que o custo do medicamento não é pago pela pessoa que recebe o benefício do medicamento, mas pelo público. Medicare e Medicaid são exemplos de financiamento público. Sem financiamento público, pouquíssimas pessoas poderiam pagar US$ 89.000 por ano, então a Marathon Pharmaceuticals cobraria menos para maximizar o lucro. Com o financiamento público, as empresas farmacêuticas param de tomar decisões de preços com base na economia da acessibilidade e adotam comportamentos de busca de renda [rent-seeking], como obter decisões de preços favoráveis ​​pelo CMS (Centers for Medicare and Medicaid Services). Para um economista, buscas de renda são rendas derivadas de privilégios políticos, e não obtidas pelo comércio voluntário. Os candidatos ao esquema tentam adquirir privilégios políticos em vez de competir pela inovação. As empresas farmacêuticas são buscadoras de renda quando solicitam privilégios de monopólio para vender um medicamento, pressionam as agências governamentais a cobri-lo sob financiamento público e depois expandem as indicações de tratamento para maximizar as vendas. Angus Deaton, Prêmio Nobel de Economia, criticou a busca de renda pelas empresas farmacêuticas. Em entrevista ao The Atlantic, Deaton disse: "Meu palpite é que o FDA está agindo basicamente no interesse das empresas farmacêuticas", em vez de servir ao interesse público. O financiamento estatal de medicamentos permite a extração de riqueza da classe média e pobre e a transfere para as empresas farmacêuticas ricas. Em vez de obter lucros oferecendo medicamentos valiosos a preços pelos quais as pessoas pagam voluntariamente, as empresas farmacêuticas extraem rendas não-adquiridas por meio de privilégios do governo. Diferentemente do capitalismo, que gera riqueza e melhora a todos, a busca pelo corporativismo retarda o crescimento econômico. Esse processo de busca de renda não se limita a medicamentos caros que tratam distúrbios raros; os preços dos medicamentos são estabelecidos com base em escolhas políticas em todo o espectro.


Figura 1

Legenda: Medicare Parte D, benefício total de medicamentos. Benefício da parte D em bilhões de dólares, produto interno bruto (PIB) nominal, salário médio por hora e índice de preços ao consumidor (CPI) foram normalizados para o ano de 2006 e escalados para o benefício da parte D em 2006 para ilustrar claramente as taxas de crescimento comparativas nessas variáveis.

Desde um início modesto em 2004, o benefício de medicamentos do Medicare Parte D cresceu para US$ 89,5 bilhões em 2015 ou US$ 2.141 por beneficiário por ano. Esse benefício é o dinheiro extraído dos atuais e futuros pagadores de impostos e pago às empresas farmacêuticas. Observe o rápido crescimento dos gastos de 2004 a 2006, quando a cobertura total de medicamentos ambulatoriais se tornou disponível. O crescimento subsequente nos gastos reflete as mudanças à medida que novos medicamentos se tornam disponíveis e os medicamentos mais antigos enfrentam a concorrência dos genéricos. Uma análise da AARP sobre o preço dos medicamentos amplamente utilizados pelos idosos entre 2005 e 2013 demonstrou que, para cada trimestre desde dezembro de 2005, uma cesta de 280 medicamentos genéricos era menos dispendiosa, enquanto uma cesta de 227 medicamentos de marca aumentava mais rapidamente de preço do que o índice de preços ao consumidor. A figura 1 ilustra que o crescimento do Medicare Parte D (mesmo desde 2006) é mais rápido que o PIB ou o salário médio por hora, de modo que as tendências atuais não podem ser sustentadas. O crescimento é mais rápido que o aumento do CPI. Observe o crescimento mais rápido dos benefícios da parte D desde 2013. O benefício total cresceu de US$ 69,3 bilhões em 2013 para US$ 89,5 bilhões em 2015, mais de 29% em dois anos. Os administradores do Medicare atribuíram esse rápido crescimento à cobertura de medicamentos muito caros para a hepatite C. A AARP encontrou um aumento semelhante no crescimento dos preços de medicamentos especiais e de marca desde 2013. Antes de podermos tornar os serviços de saúde acessíveis, precisamos confrontar por que uma mercadoria anteriormente acessível se tornou inacessível. Em 9 de fevereiro de 2017, o FDA concedeu privilégio de monopólio às vendas nos EUA de deflazacorte à Marathon Pharmaceuticals. Em alguns dias, a Marathon Pharmaceuticals aumentou o preço do deflazacorte de US$ 1.500 para US$ 89.000 por ano. Esse aumento de preço não foi um exemplo de fracasso do capitalismo de livre mercado. Em vez disso, esse aumento de preço foi um exemplo de como as regulamentações governamentais anticompetitivas quebram os mercados em funcionamento em favor das empresas que procuram por capitalismo de estado.


 

Sugestão de leitura: Artigos sobre o tema da saúde americana.

 

Artigo original publicado no dia 13/08/2017 no Mises Institute, podendo ser conferido aqui.


[Nota do tradutor: Em caso de quaisquer falhas de tradução, favor nos contatar em nossa página no Facebook ou comentar abaixo. Ficaremos extremamente gratos.]

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